Oh, minha cidade
De caóticos cantos urbanos
Quando trafego por entre a tua noite
Sinto teu calor ululante
Tua fome de teus prédios abandonados
Escuto, mudo por detrás das igrejas
Teus ratos boêmios que cheiram sangue
Teus históricos e abjetos silêncios
Mora em mim o que moro em ti
Minha cidade resguardo
Minha cidade fantasma
Que me dá o gosto temporal nos ouvidos
Me nega o semblante abastado de suas rezes
E me grita pausadamente suas rezas
Oh, minha Uberaba sem nome
Teu nome é minha assinatura
Tua chuva densa e teu sol rarefeito
Teu mercado antigo
Nossas Santas Teresinhas no pescoço da colina
Tuas folias de reis vivos e mortos
Teus janeiros atrofiados
De veias que sangram meu sobrenome
De largos que ostentas sem estrelas
Oh, cidade nascente
Deságua em mim lágrimas secas
Anárquicas, impróprias, cadentes
Procuro em ti, cidade poente
A barra do dia que cobre a poeira
Teu jeito sereno de maltratar os forasteiros
Teu jeito ímpar de trazer despátrios
Tua fome horrenda de palavras orlândicas
Tua sede de esquinas normativas
Ruas e ruelas, párocos e pálpebras cegas
Minha megalópole de jamais
Meu Zebu caminhante
Me deito a teu mar
Sob a luz de céu profundo
Tens em mim palavras imundas
Tenho em ti profano olhar
De longe, quando em pátrias outras
Quero teu colo mais uma vez
Lembrar sereno como tuas ruas de pedras
Que saio de ti para longe
Não foges de mim nem de perto.