sexta-feira, 27 de agosto de 2010

o silêncio e as palavras

Tem dias que o copo entorna. Percebemos isso calados, pensando porque as coisas acontecem e porque as pessoas sempre agem da forma que agem. Algumas coisas não tem resposta e, talvez por isso, não careçam de maiores observações. As pessoas recalcadas sempre jogam pedras e não pensam na possibilidade de ter um telhado de vidro. É indiscutível, tem gente que joga pedra mesmo, acerte em quem acertar. Isso independe da permissão das outras pessoas pra acontecer. O que nos faz diferentes diante dessas situações e dessas pessoas é a possibilidade de não fazer o que elas fazem. É sempre bom lembrar que as pessoas não fazem mal pros outros sem atingirem a si mesmas. O caso aqui não é oferecer a outra face, nem tampouco de devolver os golpes e as ‘pedradas’. O caso é simplesmente olhar para as situações como se estivéssemos de fora. O caso é olhar pra dentro de nós mesmos e ver que o silêncio fala mais alto em várias ocasiões. Quando lutamos a vida toda pra falar e conseguimos nossa vitória, nos sentimos agraciados, recompensados. Mas ter o direito de falar não é ter o direito de tratar mal as pessoas, mesmo quando essas pessoas te tratam de forma inadequada. Todos acham que o dever de falar é mais importante que o direito de silenciar. O que geralmente acontece com pessoas recalcadas que se sentem num mundo de micropoderes é que elas começam a destilar veneno e atacar os outros. Bom, o fim disso ninguém sabe, mas geralmente aqueles que gritam acabam ficando roucos. Silenciar não é negar-se, não é calar-se diante das atrocidades, não é permitir que as pessoas façam o que querem, não é também se fazer de vítima. Quanto mais você gritar com o agressor mais força você dará a ele pra gritar de volta. As pessoas que fazem isso acabam enfocando a si mesmas, trazendo indissolução pra um problema que só faz crescer dentro delas. Certa vez, conversando com um amigo que considero ser muito sensato, percebi que quando ele silenciava ao som de gritos de afirmação dos outros ele dava chance a si mesmo de compreender o mundo e de crescer na adversidade. Quando alguém grita pra falar mais alto acaba perdendo a razão. Os melhores homens e mulheres são os que sabem o valor incrível do silêncio. Falar sempre é mais fácil que calar. Calar é simples e econômico. Antes da fala só havia o silêncio, depois dela, calar-se é questão de opção. Antes de tudo havia o verbo e depois, quando o copo entornar, o verbo é silenciar.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Weather

Quando vejo o sol se escondendo de longe
Me lembro de você que chegou bela e inteira
Nada de emblemas de metades carcomidas
Nada de rancores e violências verbais
Quando o sol planeja brilhar
Planejo mergulhar no seu olhar noturno
Que tanta alegria me dá quando ilumina meu quarto
Que tanta alegria me arranca quando é quarto de lua
Quando vejo o som do seu gosto
Me esqueço de lembrar dos pedaços que me roubaram
Calculo sistematicamente o movimento dos astros
E neles vejo o amor que temos em nossa caminhada vespertina
Parece que tem ‘soul eyes’ tocando como trilha
Parece um abraço de alguém que gritou por um beijo
Ou um beijo de quem somente silenciou o toque
E quando entras pela minha porta vestida de Deus
Me curvo sorridente diante da beleza singela
As plantas cheiram mais e se esverdeam com seu vestido
Os pássaros parecem contar o ritmo do seu andar delicado
Do seu estar confuso
Da sua certeza do amor eterno
Quando sua roupa insiste em sair do corpo
O céu treme tão delicado que arde uma chama
Com ou sem pavio, cheia de luz que acaricia
Que sorriso é esse, bela mulher?
Como poderia eu nomeá-lo?
Ternura, simplicidade, perfume?
Quando a lua brilhar lá no alto me acorde
Cante aquela nossa canção que só você soube escutar
Já agüentou tanto weather report que se santificou
Nunca reclamou do amor ser torto, nem quis enretá-lo
Quando me mostrou o caminho fiquei calado
Estupefatamente mortificado pela certidão do desejo
Obscurecido pela luz do lusco-fusco que não cala
Que calor é esse, mulher una?
Como poderei eu chama-lo?
Depois de tanto caminhar entre as sombras de braços enfermos
De mãos que não sabem colher nem tratar sequer uma flor
Onde andei que não te encontrei?
Onde andou que se escondeu?
Dorme tranqüila, pois te vejo
Acorde com a mais bela música do mundo
Te espero sair do câmara escura para fotografar sua alma
Bêbada de tantos beijos serenos
Agora eu sei porque pergunto
Quer escutar ‘Naima’?

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Carta

Não quero a distância do espaço bruto

Nem a rima instalada no canto dos poemas

Só a saudade que continua perseverante

Mas se escorre aos poucos como a areia das mãos

Quando? Não me pergunte, não quero responder

Não direi não ao querer dizer sim

Nem o contrário

Um resgate irmão do pedido de ajuda

Na noite calada onde só insanos versos escutam

Dia lindo e nublado e de sol e de lua

Sem amor não correspondido

Apenas amor findo

Ah, meu anjo...a dor andou me espreitando

E o amor que faltava...faltou

Não deixou lembranças nem endereço

Mas por que chorar?

Chorar da forma que desejar

No sorriso, nas plantas, nas lágrimas

Nos escritos, no cantar, no andar sem destino

Olha meu anjo...os sonhos todos fugiram do caminho

O pesadelo não pesa mais como antes

As consoantes continuam sem amedrontar

A insônia irá morrer...possivelmente

Olha o dia chegando, meu amor...olha

Amanhã vou acordar abraçado com lembranças

Vou assistir a um filme sozinho

Rir sem ter com quem comentar

Mas isso é normal, não é?

Bom, se não for...deixa estar, quem sabe alguém me acompanhará?

Não espero nada dos outros, ando tão só que espero mais do vento e do tempo

O vento faz um barulho muito sutil...lembra, minha querida?

Tínhamos planos, guardados agora nos guardanapos dos lugares onde não estivemos

Será que nós morremos? Ou simplesmente ficamos encantados?

Sinto falta ou saudade...mas quem não as sente?

O silêncio corta o amor pela pele...sangra a alma

Mortifica os pensamentos

Já pensou? O amor acabou num final de semana qualquer

Nunca pensei nisso

As mãos dadas se separaram enfim

Não sentem mais arrepios quando estão juntas

Ganharam o medo de nunca mais

Ponto final


Rasgando os panos da sensibilidade

Aqui estamos nós

Peregrinos incansáveis em busca de momentos felizes

Duros caminhos a serem perseguidos

Caminhos de flores e espinhos

De dias e de noites rápidas ou intermináveis

E nos preparamos para o mais provável

Deparamos-nos com o inimaginado

Freqüentamos, de forma diversa, as mesmas vírgulas do caminho

Moramos em frente a inúmeros pontos interrogativos?

Nadamos livres pela interpretação

Quadros na parede do planeta e o planeta na mesa de jantar

Vamos, estamos prontos pra mais uma reunião

Mãos sobre a mesa pra que admiremos as possibilidades

Numa linda canção que espera que se sirva um alimento

Alimento necessário pra continuarmos a semana ou a vida

A bênção que é estar vivo e nem sempre pronto, mas eternamente em movimento

Hora do choro, hora do sorriso

Que ledo engano é achar que as coisas se resolvem sozinhas

Que inútil atitude quando tentamos resolver tudo e não deixar o tempo fazer seu trabalho

Ser livre nas palavras que banham as páginas dos capítulos

Tentar quantas vezes necessárias e saber jogar a toalha quando finalmente acabar

Ponto final.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Como vem o poema

Tem dia que o poema não vem de jeito nenhum
Tem dia que ele vem alado, acompanhado de frases crédulas e versos amenos
Outras vezes vem áspero e cortante, voraz e impiedoso
Pode ser que venha calmo e sereno, arrastando asas de versos monossilábicos
Talvez venha seco, engolido à seco, rasgando traquéia abaixo
Doce ou amargo, depende do humor dos poetas
Ao pensar nisso acabamos por ver que ele é tão bonito como o motivo que o fez brotar
Uma flor, uma dor, uma musa, uma cor, uma blusa de frio esquecida pela pessoa amada
Um anel deixado pelo encontro rápido, uma flor que murchou dentro de uma página
Tem dia que o poema teima em esperar, nos deixa parado, perplexo, ansioso
Tem dias que ele faz totalmente o avesso, agita, desespera, expulsa, acalma
Ah, mas a culpa é do poeta, de seu dia, sua noite e de sua musa
Principalmente da musa, sem ela não haveria poema
Quando ela nos conta que chorou o poema nada no pranto e se veste de colo
Quando ela dorme serena e seminua em nossa cama o poema transborda em sorriso
Se ela nos diz aquele ‘não’ caótico o poema é tão forte quanto os suspiros impressos
Se ela nos joga o sapato em dia de tensão psicoquímica o poema se enche de interrogações
Quando ela diz carinhosamente que ama o poema é ao vivo
E quando o poeta não tem motivos tem poucas opções
Fingir que é um sofredor
Fingir que é um fingidor
Fingir que ama loucamente
Ou escrever uma dessas bulas sobre como deve ser o poema

sábado, 29 de maio de 2010

Para todos

Me lembro de olhar pras nuvens com mais ternura, pra lua também, com mais vontade de obter boas sensações. Me lembro de amar como uma criança, de cair e levantar também. Sinto, no mais ínfimo de meu ser, a hora de partir se aproximando. È só uma bela viagem ao desconhecido, mais uma delas. Me lembro que esquecerei de tudo em breve e que lembrar não passará de manchas de tinta na carta não mandada. Sinto que o mundo me devora e que o existir é um capítulo descortinado pelo tempo. É isso, o tempo é o maior remédio e o mais forte dos venenos, o mais poderoso perfume...um chá de erva calmante que dura pra sempre, uma dor que dilacera até que as luzes se apaguem em câmera lenta. Navegar é necessário, senão navegasse não teria sentido construir o barco. Me lembro de crianças batendo palmas e ouvindo uma flauta oxidada. Me lembro de suspiros e sussurros que eram de amor, de uma amor que parecia de verdade, o único que tive. Gostaria de dar-lhe um beijo e um abraço, os mais sinceros e positivos que possam haver. Não há mais tempo, mas o tempo sempre haverá de existir, é como o vento que muda de direção e para de nos acariciar a pele, os cabelos e as mãos. Fiz meu home work e agora posso dormir em paz. É a única coisa que espero ter ao viajar. A gente tem esperanças de que o clima e as boas marés nos tragam de volta. Me lembro de ter passado angústias e alegrias maiores que sinto agora e penso que algum dia, um dia qualquer, talvez sinta algo maior. Me lembro da música tocando, dos amigos sorrindo, de ter fugido e me escondido, de ter sido encontrado, de ser descartado, de estar perdido e de estar total e inabalavelmente seguro. Me lembro de duvidar e acreditar piamente em Deus, de Deus com maiúscula ou de deus com flores humanas. Me lembro de ter merecido e de ter ignorado, não me lembro de perdoar e entender profundas coisas. Esse capítulo esteve por ser escrito. Me lembro de escutar promessas e de fazê-las. Me lembro de não dar muita atenção à mudança da acentuação na língua portuguesa. Me lembro de ter estudado muito e de não ter estudado o bastante, de ter pedido ajuda um milhão de vezes. De ter valorizado sobre humanamente quem me ajudou, de ser e não ser valorizado quando ajudei...ou quando tentei ajudar. Agora não tenho mais medo, me sinto apenas um ‘estar no mundo’ e, por isso e por outras, não quero que desçam lágrimas, só orvalhos em folhas noturnas. Me lembro de ser embalado no berço, de ser amado como filho, de estar doente e de ser curado. Me lembro do suor e do sereno, do cheiro e do som, da música e do ruído, do passado e do presente. Espero não ter esquecido de nada.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Ocaso II

Estáticos, homens e mulheres olhavam atentos
O sentar-se do sol atrás daqueles verdes montes
No que pensavam¿ Realmente não sei
Talvez no não descoberto
Também no não entendido

O acontecer das coisas me embriagava de paixão
Vivia aquelas não respostas como sinais do prosseguir
Não tinha rumo, mudava de idéia, mudava de sentido
No português antigo que diferença não faz
Pensava no algo mais, nas almas perdidas pelos becos

Sentia o desejo do instantâneo remédio
Sentia o desafio do perene negar-se
Naquele ocaso as pessoas viam desaparecer o astro
Que por todo o dia iluminava a terra
Eles pensavam em si mesmos

Em como as paixões se foram
E como eles poderiam voltar
Aladas de momentos felizes e tristonhos
Arregaçadas pelo tamanho dos sonhos
Arrebatada pelo infinito sonhar

Os amores anoiteciam como àquela hora
E voltavam a nascer na noite enluarada
Num momento sublime onde o tudo se faz nada
No fundo mais recluso dos pobres corações humanos
E no recôndito armado de esperanças viris

Amar além de mais nada, apenas amar
Subverter o cansaço, não desistir
Ficar louco e de pouco voltar
À uma lucidez que espanca só te fitar
Ao desconforto do ‘não’ depois de tanta luta

Mas assim se constroem os fortes
E assim se revelam as fraquezas
Presas enloucadas num coração que palpita
Gritando desvairadas pelos campos aonde se vai o sol
Berrando incalssavelmente uma só frase:
-Por onde vais ó perdido amor meu?

terça-feira, 16 de março de 2010

Comigo tenho aquilo que envelhece
Que faz caminhar sem medo de estar longe da infância
Mas ela sempre me vem alada e cheia de carícias
Carícias noturnas e indeléveis paixões
Ainda que os corações fiquem crus de lembranças
Há de se tornarem esperança fortuita
Que vem do nada e que abraça tudo
Comigo tenho aquilo que me leva
Pleno pelas águas barrentas ou límpidas
Vejo nas máscaras do carnaval as máscaras do dia a dia
Page up and page down, pedem as teclas
Do não caneta esferolínfica que aborda as cordas amarradas
Parede enfeitada de cores e amores que vem e não voltam
Coloridas paredes que não falam e não calam
Não tem cuidado ao denunciar nossas vicissitudes
Em mim tenho a certeza do dia seguinte
E a incerteza profunda do final feliz
Pairando sobre os astros da mais bela noite
Olhando a lua prateada que nos cerca e conduz
Para chegar ao extremo complexo é preciso tentar o todo de suor
E lágrimas que secam e voltam caladas em choro sintético
De todas as proparoxítonas saltam respostas interrogativas
Só nós mesmos podemos romper a solidão
Apenas nossos corações podem gritar calados de alma
Indesejável calma num alarmante e repentino soluço
Busco, cavo, procuro
Calo, sorrio, me deixo
E no desejo incontrolável de olhar olhos em sono profundo
Nas larguras e distâncias de um lugar no não mundo
Dores, angústias, penas reais
Flores, poemas e mais
Cada um sabe da delícia e da dor
Cada qual vem como pode, armado ou desarmado de amor
No som da cascata
Nos ruídos da mata
No sentar e observar o futuro
Nas mãos que encobrem o rosto no escuro
Comigo tenho aquilo que não sei
E, se por acaso soubesse, não teria razão de ser

quinta-feira, 4 de março de 2010

Alf

É, hoje comprei uma esferográfica
Azul como o mar que me lembra Paraty
Rasguei as folhas e escrevi direto
Rompi as fronteiras do meu amor calado
Comprei uma roupa pra lembrar do colorido
Nadei incessantemente pra lembrar dos pulmões
Corri na chuva pra lembrar da sinusite
Pois é, pois não, chamei uma amigo pra tomar sol na grama
Olhei nos meus olhos e tive vontade de chorar
Como não veio o drama o sono me consolou
De estar tão presente num mundo tão distante
Claro, não tenho limites pra dizer que eu amo
Não tenho histórias pequenas pra por em plano
Coloquei o relógio que me marca a despedida
E a corrente da estrela de David que me faz companhia
Pensei em tatuagem nas costas
Imaginei uns dez anos no futuro
Pulei o muro da vergonha estampada
Marquei três gols na mente inebriada
Falei aos amigos que sobraram inteiros
Que amigos verdadeiros não tem costas
Chorei como um anjo pedindo perdão
Abri todos os livros e circulei os ‘nãos’
Olhei pro anel no dedo mais grosso
Alonguei as pernas e o pescoço
Andei pela relva molhada de máquina
Maquinei os passos que davam errado
Na maior honestidade que o futuro tem do passado
Não passei na prova e também não morri por isso
Não marquei consulta nem mesmo compromisso
Só neguei a mim mesmo que não dava pra ir
Ao encontro que eu nunca pensei em estar
Parei instintivamente frente a razão
Dormi abraçado com o travesseiro
Olhei fotos belas de Portugal
Li que morria Alf no jornal
Lembrei-me das bossas e dos pianos
Olhei por engano pro meu violão
Cansei de tocar com dedos em carne
Amei noite toda uma só paixão
A flauta é mais leve e toca meu ser
É
E assim que tem que ser

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Veraneio

Olho o tempo, vejo nele todas as memórias espalhadas
Parecem recortes de jornal, parecem folhas de árvores de verão
Olho pra dentro do meu peito, vejo as falas caladas
Vejo e ouço em silêncio o que não disse
Mesmo assim, o que vejo e ouço parece real, parece acontecido
¿Quem no mundo passará sem dizer palavras¿
¿Quem no planeta falará com toda a razão que existe¿
Posto que vero, posto que insano, mas verdadeiro
Um soluço na noite proclama o abrir de janelas em ruídos baixos
Um passo no degrau sonoro da velha madeira que meu pai construiu
Sinto sua alma bela e serena penetrando meu sonho sofrido
Acendendo uma luz de vela, velando meu sono
¿Quem poderá negar sua presença em meus braços¿
¿Quem poderá certificar sua ausência em minha alma¿
A calma que me traz nosso encontro é o que me faz inteiro
Vendo seus passos seguidos de pressa e cadência musical
Será música, será tema, de minha mera e pequena saudade
Tenho agora o que não sonhei, tenho a real franqueza do exato
Posto que lindo, posto que cálido e sutil veraneio em outono
Válidas promessas alimentadas de sono, doses homeopáticas de sobriedade
Passos curtos em direção do que ainda não foi completo
Do que ainda não foi descoberto
Real sorriso que pinga mel de lábios ferido
Fiel olhar que pinga lágrimas de eterno caminhar
¿Será você, criatura, meu mal em vida inteira¿
¿Será você, ternura, meu sal de cura¿
Não preciso saber
Me contento com o simplesmente
Me contento com o amanhã
Me contento com a dúvida
E duvido, sobretudo, de tudo que possa não vir
Se a vida é luta, serei guerreiro
Quando houver flores, jardineiro.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Ontem

E agora o que me resta
É restar-me a mim mesmo
No calor que outrora era
Na era de um começo novo

Tudo se basta eterno enquanto dure
Tudo se faz feliz nas alegrias
Por isso, tudo é preciso
É preciso fazer dos espinhos flores

O erro? Não nego, espero que a natureza se cumpra
Sentimental e cheia de razão de ser, abençoada
Comprando nas lojas os retratos das almas perdidas
Encontrando na falta do relógio a fuga perfeita

Não, não há o que queixar, não há olhos para lágrimas
Há olhos para a relva, para o pôr do sol, para o rio que passa
Tudo se enerva lentamente como se acalma
As feras e os anjos andam nesse mundo de mãos dadas

Atadas mãos que escrevem a última carta de amor
Seladas pelo destino cruel ou pela liberdade de seguir
Trancafiados estamos, dentro de um nó em nós mesmos
Seremos nossos próprios momentos de dor e alegria

Mesmo que nos tirem o dia, mesmo que nos tomem a noite
Mesmo que nos venha a ferida e o açoite, mesmo que não venha o afago
Pagando promessas não feitas e fazendo por outro caminho o fardo
Farto de andar na direção errada onde tu encontrarás o certo

No deserto de todas as vontades, no mar de todos os desejos
Nos dias de briga, nos dias de amor, são eles os mesmos?
Mas agora resta solidão em silêncio mais que profundo
Um mundo inabitado onde flores de cor púrpura se espalham

Tu eras o que eu tinha de completo, tu és a imperfeição que amei
Eu seria o que estava de errado, eu sou o que não sei
Eles dirão o que a memória esqueceu nas folhas brancas do tempo
Nós faremos que as folhas sejam preenchidas de cores e odores

Depois do nada a vida, aquela que queremos sem saber os porques da busca
Agora tens de mim o que há de mais correto, a falta eterna
Agora tenho de ti o abandono na hora certa
Tenhamos de nós o que há de ser verdadeiro em outras linhas, braços e abraços

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Das águas

Todos já tiraram suas roupas do armário
As palavras do dicionário
Coração sangrando e pálpebras semifechadas
A madrugada se anuncia no silêncio da rua

As almas todas nuas num alvorecer de mentiras
Num delírio estranho e comum de vaidades terrenas
A mão que escreve o poema pede licença
Rouba a presença, mata a ausência terrível de paixão

Ininterruptas vontades que explodem sem permissão
Indeléveis coragens se espalham pelos cantos do quarto
No imenso retrato de coleções de sorrisos abandonadas
A noite açoita o dia e traz impávida a vida das plantas

Planto o que não há de ficar calado apenas
Pranto que não vem de forma inusitada
Dores de amores perdidos e confusões de palavras achadas
É assim que o plebeu encontra a amada vestida de iluminada lua

O poema não conta os pontos onde a viola para de pontear
O som do embate, o grito do indiscutível, o medo do corajoso
Os nervos do corpo à flor da pele, a pele necrosada da falta do toque
Num imenso mundo, profundo oceanos de vozes inertes
Inerente a vida se apresenta a arte de caminhar

O sol e a lua travam uma peleja sem pares
Não paridades de um amor que nunca se encontra, não se encontrará
Mas se encontrara talvez num passado onde não havia vida humana
Sem perdão nem culpa, sem amor nem lágrimas

A luta interna declara guerra às paixões de latão
E se enche de ar ao esperar o amor de ouro
Onde a procura voa tranqüila como fênix que nasce
Meu amigo, nem Freud ousaria pensar naqueles dias

Perco o caminho de casa, procuro o abismo eterno
Amarrado em letras com pedras sinalizando o findo orgulho
Num mergulho sereno onde nada a solidão escolhida
Onde se debate incansável a solidão acompanhada

Acho o caminho da vida em braços outros
Decido descer entre o lodo das pedras das falésias
Me escorrego e a ferida vem à tona, selvagem, bela e indolor
Traio de vez a dor que me vem embalada na última palavra

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

VIVER

A vida é um campo aberto. Uma vasta praia onde os olhos se deixam marear pelas ondas e pelo sal. A vida passa lentamente pra alguns e rápido demais pra outros, principalmente se esses outros são representantes do nosso meio de amor na terra.
O mundo é um passe de mágica, onde as pessoas nascem, crescem e morrem, aprendem, esquecem e tornam a aprender. É onde vemos amizades nascerem e amigos partirem no barco da eternidade, deixando saudade e ternura, lembranças e passados que não passam. Nesse planeta somos a história viva de nosso povo, de nossa espécie, raça, crença, etnia, amores, desamores, amizades e triunfos. Também é palco inevitavelmente pleno de nossos fracassos, erros, temores, acertos, tropeços, vitória, memórias e eternificações. Viver é motivo por si, não precisamos de quimeras fluorescentes pra dar sentido à vida. Ela está nos nossos pais, filhos, amantes, amigos, inimigos. Amar é o próprio viver. Amamos as flores, o brilho do mar, as nuvens, o campo, o deserto. Há ainda aqueles que amam a guerra, a penúria, o lamento e as carnificinas, desses últimos só lembraremos na História, dos primeiros a Memória trata de eternizar. Nossas palavras e corpos são nossos campos de ação, limitados pela linguagem ou pela possibilidade, acabam por nos dar as maiores sensações que podemos ter, lendo um livro, escrevendo um poema, compondo uma canção, correndo na tarde fresca, sentindo o amor do outro e fazendo o outro sentir também. Passemos então a olhar nossos pés, por onde andaram, porque andaram, porque não pisarão e não pisariam. Não ousamos às vezes e perdemos por isso, ousamos demais e sofremos. É necessário, prioritariamente necessário, saber escolher entre a dor da frustração e a dor da dúvida de nunca ter tentado, entre o sol poente visto da colina ou do engarrafamento, da água que sacia ou daquela que afoga, do amor que alimenta ou do sentimento que transforma nossos possíveis gostos em fel profundo. Só isso poderia saciar a alma? É uma pergunta que passaremos toda a vida tentando responder.

domingo, 31 de janeiro de 2010

aos verdadeiros amores

Tratar bem é prioritário. Não é só dar colo ou ombro, é respeitar o amigo diante os outros. É saber que limites existem além da necessidade do egoísmo de se sentir bem. É saber que se o amor é latente ele pode ser rechaçado, mas não ignorado, maltratado ou vilipendiado. O amor é algo inevitável porque construímos isso no olhar, na conversa, no abraço, no sentido mais amplo da palavra ‘sentimento’. A agressividade destrói o sentido do amor amigo, do amor amante e do amor irmão, do de pai, mãe e filhos. O absurdo se propaga nos princípios mais ínfimos. É onde o amor se faz dolorido, é onde o negar-se se torna defesa não estratégica, mas puramente defesa de sobrevivência. Amor e doar e não socar, como as mãos ou palavras, gestos, ações. O que os outros vão achar da gente não é prioridade, apesar de ser necessário causar boa impressão. É impossível agüentar o ignorar do sentimento de quem realmente ama, de quaisquer formas. Se não há respeito não há amor. Se não há hombridade não há amizade, se não há desculpa também não há perdão. Quando amamos, além da paixão, além do ombro amigo, nascemos como adultos fortes, não inertes, presentes em todo sentido, no significado mais profundo da palavra ‘amor’.

sábado, 30 de janeiro de 2010

Hoje

Pasmo, olho os olhos em cores em minha frente
Verso da palavra, palavra em verso dilacerado
Forte abraço quente, doce, amargo, agridoce
As costas contam capítulos interminados
Param diante de olhos que querem se encharcar
Mas não conseguem nem no tempo úmido depois da chuva
Sangue rosa, vermelho e preto, sangue límpido de doador
Se à dor me dôo, dou de mim o que há de pleno
Serenamente sereno, que no telhado há de ficar até o amanhecer
Arranha-me, arrasta-me, arranha-arrasta-me-te
Aos pés do vencedor
E de quem a dor vence ou vence a própria dor
Venha, veja e vença, sentença rasgada na folha de papel
Na folha da flor que não veio
Na veia da flor arrancada
No cheiro da dor inodora
No adorar de almas distantes
Venha, veja e vença
O que não há de perseguir o medo
Aquilo que não tem que perdurar pelos anos
A hora que não tem que passar pelos dias
O botão que não ousa passar pela casa
A camisa que não se dá ao vestir
O silêncio que não se dá por mudo
O Muro que não se dá por fronteiriço
A fronteira que não se dá pela elasticidade
O amor que não se extingue pela prática
A paixão que insiste em beirar loucura
O remédio que, mesmo torpe, acalma como incenso apagado pelo vento.
Beijo

A flor ofertada oferta-me a me dar
Um grito tamanho em silêncio patológico
A lógica da paixão e o vermelho nos olhos
A cor da flor é rosa, o nome da flor é beijo

E o beija flor navega, pelo ar descendente
Incendeia a sala e o coração vazio
Escorre pelas veias vermelhas
São várias cores de rosa estampadas

Arruinados pelo tempo que não resta, nos restamos
A colecionar olhares sem fronteiras
Que entranham estranhamente a mente alcoolizada
Arranha as paredes coloridas de beijos não dados

O meu coração é raio, ou para-raio em português antigo
Chafurdando pela lama escura de um fundo iluminado
A cor, a ação, o mal solto em nossas mentes cansadas
A ação, a falta dela nos nossos corações carentemente certeiros

Certo como tiro que já cheia à dor, dor, de certo, certa
A solidão acompanhada de bolhas flutuantes no copo
O coração vazio de sementes que florificariam, acariciando
Forte como a neve que encobre os sentimentos solitários

O casamento do encanto desencantado e do desencanto sob a luz
Luz eterna que se arrasta pelas pernas, braços e olhares
A chuva vem misturar-se às palavras de sim e de não
O talvez espreita um olhar na esquina de todas as horas

Te espero como desespero, te amo como Platão
Te olho como Baco, te perco como Afrodite, te ouço pelo ‘não’
Mas ouso não ouvir nada, obliterar, sangrar pelos dentes, olhos e pernas
Sentir o gosto do suco hemolítico que invade meu paladar

Paro, olho, sigo...não chorava, hoje não, não sei se saberia
Mas o ombro é amigo, os olhos, as mãos, o abraço fraterno que confunde o peito
Olhos nos seios e a mão vazia, vaga pelo vento sem o corpo presente
Que seja assim enquanto o poema houver de querer mandar nas palavras

E que essas palavras sejam suficientemente belas pra obturar a alma
Fugindo em mudos suspiros que me vem em fotos cegas de paixão inexata
Os cegos não vêem, mas vem com seus olhos odoríferos
Mas forte que a flor que chama beijo, mas forte que o beijo não dado.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Onde andas
Por onde falas
Por que me calas, por que me olhas

Por onde ando, por onde escolho
Qual espaço, qual peso
Espero...calado
Espero ao lado de quem me lembra

Que horas te lembro
O tempo não tenho
A féria se escassa
O embaraço me embaraça

um beijo estranho
um amor tamanho
que todos vejam
que ninguém decore

o amor demora
que o amor demore
ande
devagar entre os becos

amanheça
teça na teia o formal
que o mal se esqueça
tenho em ti o amor mortal

que a morte me lembre
longe, longe me recorde
que o amor deserta
e espera leve

leve como a brisa.
Que o amor me leve.
Que o amor me espere
Nada que se mova no universo me move
Quando se une um verso a outro me perco
De perdidas letras espalhadas na mesa
Me peço e despeço milhares de vezes, atonitamente
Algo me mata lentamente
Um grito que força em sair e que nada ganha
Nada significa além de uma triste sensação

Apago lentamente o verso que teima em se regenerar
Nele tenho meus dias, horas, segundos semimortos
Nas linhas do tempo se escrevem linhas em círculos atormentados e finos
Algo me mata lentamente
No barulho interminável do relógio os versos se esvaem

E depois me levanto, o espanto de levantar me vem
Ninguém por perto, deserto erro-acerto em mim, perene
Tento me evitar, mas meu eu vem me buscar em força tamanha
Que em mim estranha, estranho

Não peço apreço, morto eu pediria
Mas ando em quartos, terços, duos
De minha estação não queres nada
De minha estação: água

Me perco e me acho, me tenho e me perco
Mas, que tamanho tinha o máximo enjaulado¿
Ando, mando, obedeço. Antes de tudo o nada de mim...nós mesmos

E por onde anda, tenho fé que tenhas
Fé intensa nas passadas de andares e passos
Me embaraço pelo que ouço, me acho pelo que escuto
Amor absoluto, nada mais

Morrer em paz seria no poema
A mão pequena tece o que sobra
Te tenho, te esqueço
Amor maior não mereço
Amor pior eu esqueço
Soneto

Som...ethos
No caminho da realidade todas as mentiras se dissolvem
Todos os caminhos do planeta se encontram
Um coração dilacerado e um olho aceso
Como nas orações de Ghandarva
Como no navegar lento e manso do barco
Num fim de tarde no velho Chico
Não quero das dores os segredos
Nem o medo que me afasta do futuro
Quero das dores o poema
E do medo a segurança de que não tê-lo é temeroso
Andando pelas praias límpidas onde deixei meu sound of reagge
Caminhando pelas chapadas floridas de argiréia nervosa
Um pouco de arnica no fim da romaria
Um pouco de carinho heart inside of peregrino
A morte que sonda passa, respira o hálito rasteiro da vida flowered
Um pouco de sangue nas veias
Sei que sou rapaz esforçado
Nada calado, nada quieto com lágrimas prontas
No encontro das águas dos nossos olhos
No não encontrar do óleo e da água
Como um grande edifício com mensagens de quimera e belerofonte
A máquina mercante pega a grande barca do inferno
Com todos os enfermos fora da enfermaria
Com todos os erros fora da ortografia
Com toda a semiótica do semicego que ouve muito bem
E nada entre as forças profundas
E dança entre as tristezas e alegrias das interpretações
Das ações entre os que navegam na noite escura
Estarei entre vozes atentas pra gritar a qualquer momento:
“me liberte, simplesmente me liberte...totalmente@”
E da mente total quero sombra e vento fresco
As horas não se passaram, não se passarão... entre nós
Nos nós bem ou mal dados do destino
Até chegar, tirar os sapatos marcados da poeira do caminho
Trago no peito o cheiro do mundo.